(FOLHAPRESS) – Renovando a pressão militar dos últimos dias, o governo de Israel promoveu fortes ataques contra posições do Hezbollah no Líbano enquanto o gabinete de Binyamin Netanyahu discute um cessar-fogo com a milícia extremista islâmica.
Em Beirute, as forças israelenses determinaram a evacuação civil de 20 regiões, a maior no conflito até agora. Antes, haviam bombardeado duramente o sul da capital e uma cidade perto da fronteira israelense, Hosh.
Segundo autoridades israelenses, libanesas, americanas e francesa, o governo de Israel deverá aprovar ainda nesta terça (26) a medida com o grupo libanês Hezbollah, em acerto mediado pelo governo dos Estados Unidos.
Se ocorrer, será a segunda trégua aceita pelo gabinete de segurança do premiê desde que os terroristas palestinos do Hamas lançaram o ataque de 7 de outubro de 2023, que disparou a guerra regional ora em curso também no Líbano.
Em novembro do ano passado, uma pausa dos combates em Gaza permitiu a troca de reféns tomados pelo Hamas por mulheres e crianças palestinas prisioneiras em Israel.
Agora o escopo é outro. O Hezbollah é aliado do Hamas e passou a atacar Israel enquanto os palestinos eram bombardeados na Faixa de Gaza, que controlavam desde 2007. Ambos os grupos são prepostos do Irã, e os libaneses sempre foram os mais fortes aliados de Teerã na região.
A partir de 23 de setembro deste ano, o que eram escaramuças fronteiriças diárias virou uma guerra, com Israel decretando ter perdido a paciência com rival do norte. Bombardeios intensos mataram boa parte da liderança do Hezbollah, inclusive seu chefe, Hassan Nasrallah.
O sul libanês voltou a ser invadido por Israel, 24 anos depois de Tel Aviv ter deixado a custosa ocupação da região. O fracasso de Beirute em militarizar a área e impedir a volta do controle do Hezbollah foi um dos pontos que pesou na crise atual.
O plano é complexo, porque as duas guerras, em Gaza e no Líbano, estão interligadas. O Hezbollah, destroçado como seu aliado Hamas, cedeu e aceitou parar seus ataques em apoio ao Hamas durante a trégua, até para poder se reagrupar e contabilizar o estrago -Netanyahu falou em 80% de destruição de sua capacidade ofensiva.
Para o premiê israelense, se prosperar, a trégua dá um respiro em uma campanha militar de alto custo, que colocou o país em rota de colisão direta com o Irã, patrono dos rivais. Tel Aviv e Teerã já trocaram quatro salvas de ataques com mísseis desde abril, algo que nunca havia acontecido na história, mas parecem ter recuado por ora.
A França, com forte influência no Líbano pelo mandato colonial que exerceu por lá de 1920 a 1943, participou da negociação. A expectativa é de que haja um comunicado conjunto dos presidentes Joe Biden e Emmanuel Macron, se tudo der certo.
A mudança de rumo na guerra decorre das condições domésticas nos EUA, também. Se a pressão eleitoral, onde o voto judeu e de religiosos pró-Israel é importante, após a derrota dos democratas para Donald Trump em outubro, Biden endureceu sua posição ante Tel Aviv.
Na mão contrária, a pressão contra o arranjo no gabinete de Netanyahu é grande, em especial entre seus aliados ultraortodoxos. O extremista Itamar Ben-Gvir, ministro da Segurança, disse que o cessar-fogo acaba “com uma oportunidade histórica de lidar com o sul [Gaza] e o norte [Líbano]”.
Já a oposição desconfia do comprometimento de Netanyahu. O principal rival do premiê, Benny Gantz, disse que é preciso garantias de que o acordo será implementado. Novamente, os EUA contam: Trump é aliado de Netanyahu, e chega ao poder em menos de dois meses.
O acerto previsto repete termos que já fracassaram antes. Prevê que o Exército libanês ocupe o sul libanês, enquanto o Hezbollah se compromete a sair da área entre a fronteira do país com Israel e o rio Litani. Sem fazer parte do acordo, o Irã é o garantidor presumido da posição da milícia xiita.
Isso já foi tentado em 2000 e 2006, sob os auspícios da ONU, sem sucesso. Um sinal de que algo pode avançar, contudo, foi a intensificação da violência nos últimos dias, para que ambos os lados saiam dizendo que estão em posição de força para seus públicos domésticos.
No fim de semana, Israel promoveu o maior ataque de sua campanha contra a capital libanesa, Beirute, matando ao menos 29 pessoas. Já o Hezbollah lançou um número recorde de foguetes, 250, contra o Estado judeu em retaliação, atingindo inclusive uma base naval.
Nesta terça, as novas ações ocorreram enquanto o governo se reunia. O preço em sangue do conflito é alto, ainda que não se aproxime em escala aos mais de 44 mil mortos em Gaza na guerra disparada pelo atentado que deixou 1.200 vítimas fatais em israel.
As mortes na frente norte, que estavam na casa das centenas, subiram a 3.750 no Líbano, país que registrou mais uma crise de deslocados internos e refugiados em sua turbulenta história. Segundo o monitor do Instituto de Estudos de Segurança Nacional, de Tel Aviv, 2.450 desses mortos eram do Hezbollah.
A campanha israelense em uma no envolveu 12.729 ataques, incluindo aéreos, 4.208 deles desde setembro. Já o Hezbollah promoveu 2.642 ataques a posições militares ao longo do ano e 4.700 disparos de foguetes só em outubro, deixando ao todo 114 mortos (73 deles militares) e 60 mil deslocados internos em Israel.
“Estamos esperando para voltar para casa”, disse por mensagem a psicológa Sarah Roth, moradora de um kibutz ao norte de Nahariya, junto à fronteira libanesa. Ela deixou sua casa nos primeiros dias da guerra, em outubro de 2023, e alternou estadias em hotéis pagos pelo governo e casa de amigos desde então.
A exaustão é ainda maior em quem está no lado mais atingido, por óbvio. “Ninguém aguenta mais, a escala de destruição é enorme”, afirmou a um grupo de brasileiros no WhatsApp Maria Khoury, uma cristã maronita que deixou o centro de Beirute e foi para uma cidade perto de Trípoli, ao norte.
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