SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Cenário de um atentado terrorista após publicar uma série de caricaturas do profeta Maomé, o jornal francês Charlie Hebdo voltou a ser acusado de “incitar e provocar o ódio religioso” nesta semana. Desta vez, no entanto, a queixa não veio dos adeptos do islamismo, mas do catolicismo.
Segundo a agência de notícias AFP, duas associações católicas, Marie de Nazareth e La Petite Voie, apresentaram uma ação contra o veículo na terça-feira (27).
O motivo era uma charge publicada pelo veículo em suas redes sociais em 16 de agosto, dia seguinte à data em que os católicos celebram a Assunção de Nossa Senhora, isto é, sua elevação aos céus.
Na imagem, a Virgem Maria aparece com as erupções cutâneas típicas de Mpox sobre uma placa em que se lê “Lourdes” –cidade francesa que atrai milhares de fiéis no feriado de Assunção por ser ter sido onde, de acordo com a tradição, a mãe de Jesus Cristo apareceu para uma jovem no século 19.
A santa chora ao ser alvo de xingamentos como “‘vagabunda”, “prostituta” e “mentirosa”. O título do quadrinho, “Mpox: Primeira Aparição do Vírus na Europa”, faz referência ao primeiro caso da doença registrado no continente, no mesmo 15 de agosto em que se celebra a Assunção.
Pessoas afetadas por mpox têm sofrido preconceito em razão de a cepa mais recente da doença ser transmitida sobretudo por via sexual e atingir mais os homens –há quem acredite erroneamente que ela infecta apenas homens homossexuais.
Mas o vírus também pode ser passado por meio do contato direto com as lesões causadas pela doença e por gotículas. Os principais transmissores de mpox em meio à epidemia no Congo do final de 2023, por exemplo, eram heterossexuais com múltiplos parceiros. Mesmo crianças podem ser infectadas se encostarem em uma lesão ativa sem usarem proteção.
Dado esse contexto, a charge parece querer evidenciar a hipocrisia do preconceito contra os portadores de mpox ao retratar Maria -que teria dado à luz a Jesus Cristo sem ter nunca tido relações sexuais- sendo julgada pela sociedade após ser infectada pela doença.
De acordo com a AFP, a ação foi apresentada a um tribunal em Paris e acusa ambos o cartunista, Pierrick Juin, e o diretor do Charlie, Riss. A direção do periódico não quis comentar o assunto ao ser abordada pela agência.
A publicação católica Tribune Chrétienne (cuja editora, La Petite Voie, é uma das autoras do processo) denunciou a charge assim que ela foi publicada, afirmando que tratava-se de uma “incitação gratuita ao ódio contra os católicos da França”.
Também lançou uma petição para retirar a charge das redes por considerá-la ofensiva. O documento recebeu cerca de 25 mil assinaturas.
Os autores da ação contra o Charlie argumentam que, “embora a crítica às religiões seja permitida, a sátira ou a caricatura não devem se tornar um veículo de ataques gratuitos e ofensivos contra crenças religiosas que arriscam provocar tensões na sociedade ou violência contra os fiéis”.
A França abrigou uma outra controvérsia envolvendo a fé católica recentemente. Diversos líderes e instituições ligadas a ela se indignaram com uma cena da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris que, protagonizada por drag queens, remetia à Última Ceia.
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